segunda-feira, 23 de maio de 2022

ESPIRITUALIDADE MATERNAL

SUS

Quando minha mãe estava doente, internada, SENDO MUITO BEM ATENDIDA PELO SUS NO HOSPITAL DA UNICAMP, mas em uma maca, no corredor da enfermaria…

Afinal de contas, o servidor público da saúde, faz de seu labor cotidiano a imagem maternal de que aqui sempre caberá mais um, nós daremos um jeito, mesmo não tendo quartos para todos. Os corredores estavam ali para serem usados, triplicando assim o número de pacientes por funcionários. É claro que alguém paga essa conta - e esse alguém é a saúde do trabalhador que, fazendo o milagre da multiplicação dos espaços, gera a vida nos outros à custa de sua própria morte.

...um dia, no corredor da enfermaria da UNICAMP, já com a saúde bem debilitada, minha mãe não dormia bem. Naquele dia eu fiquei conversando com ela das 21:00 até as 23:00 com a esperança que isso lhe trouxesse o sono e eu pudesse descansar um pouco. “Lá pelas tantas”, eu lhe sugeri que dormíssemos um pouco, ela me pediu água, e eu fui buscar. Como estávamos no corredor da enfermaria havia muitas luzes acesas: minha mãe me olha com convicção e diz com a firmeza que lhe era própria:

“NILCÉIA, VOCÊ ESQUECEU A PORTA DA GELADEIRA ABERTA!”

Eu respondi: ........

Termino a história no final do texto em defesa do SUS porque recentemente recebi um post da Campanha EU SOU O SUS e hoje quero defendê-lo, contando a minha história com minha mãe no SUS.

Compartilhei com vários contatos do zap a campanha EU SOU O SUS. Algumas pessoas me responderam colocando as dificuldades do sistema em suas cidades:

- as angústias da espera de atendimento clínico e para exames,

- a possível má administração dos recursos,

- a falta de exames,

- e outras.

Reconheço que a queixa das pessoas são legítimas e destaco que as pessoas possuem uma função de destaque em suas comunidades de classe trabalhadora e portanto são formadoras de opinião.

O que me chamou atenção nestas queixas é o fato do SUS ser colocado como o SUJEITO que gera os problemas e não a vítima de um modelo político de gestão. Não existe uma crítica ao Secretário de Saúde Local, ao Conselho Municipal de Saúde, aos vereadores que deveriam fiscalizar o sistema, ao governo estadual e/ou federal e etc.

O SUS é colocado como o SUJEITO dos problemas, ou vítima de um SUJEITO OCULTO ou INDETERMINADO, cujo nome não é dito.

As pessoas não me mandaram mensagens perguntando sobre a relação existente entre o congelamento dos gastos públicos e o fato de seus familiares e amigos queridos estarem aguardando dias, às vezes meses, para um atendimento e mais alguns dias para o exame e outros “tantos” para o resultado. Não fazem o “link”, o “gancho”, entre “A Emenda Constitucional (EC) 95, do Teto dos Gastos, apresentada como Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 na Câmara dos Deputados e PEC 55 no Senado Federal, foi aprovada em 2017” - 10 razões para defender o SUS - MST e aumento do tempo de espera do SUS.

Me pergunto a causa dessa NÃO EXPLICITAÇÃO dos responsáveis pelos problemas do SUS e me permito construir algumas hipóteses:

1- Provavelmente o DESCONHECIMENTO do amplo processo histórico que idealizou o SUS, e de toda a estrutura através do qual o mesmo é administrado à nível nacional, estadual e municipal.

2- Destaco também o fato que as pessoas não se lembram de como era o atendimento médico da classe trabalhadora antes do SUS – as pessoas não se lembram de como era esse atendimento porque ele praticamente não existia.

3- Mas existe outro fator que quero destacar. Em meu texto “UMA FRASE JESUÍTA: TOMAI SENHOR TODA A MINHA MEMÓRIA” - Diálogos: Resultados da pesquisa TOMAI, SENHOR, E RECEBEI TODA A MINHA MEMÓRIA (nilceiaeulampio.blogspot.com) falo sobre a DIFICULDADE da nossa mente de focar e guardar aquilo que é positivo dentro dos processos vividos. Então é compreensível que em uma situação de perda da saúde, as pessoas lembrem de todas as mazelas que sofrem ao buscar o atendimento médico. A demora para se chegar, o medo de não ser atendido, medo de não ser encaminhado, que o profissional não seja bom, que a máquina do exame esteja quebrada, que apareça um caso mais grave e volte para fila de espera. Enfim, as variáveis para que tudo dê errado em um sistema público de saúde no Brasil é imensa.

Pode ser que essa variável provoque tamanha ansiedade que impossibilite de observar e valorizar os aspectos positivos do SUS. Sem perceber esses aspectos não é possível divulgar e defender com “unhas e dentes” o sistema, e muitas vezes em um gesto que eu considero de “loucura social”, começa-se a lutar contra ele e votar em políticos que o querem destruir.

Assim busquei na internet algumas informações básicas sobre o SUS e compartilho aqui, com o objetivo de reconstruir a valorização do mesmo no IMAGINÁRIO COLETIVO da classe trabalhadora:

1. História do SUS: Dia 21 de março foi o dia escolhido para comemorar o Dia do Orgulho SUS, por ter sido o último dia da 8ª Conferência Nacional de Saúde de 1988, cujo relatório gerou os princípios do Sistema Único de SUS

2. Princípios do SUS - Os princípios do SUS são divididos em princípios doutrinários e princípios organizativos, conforme explicado abaixo:

- Princípios doutrinatários: universalidade, integralidade e equidade.

- Princípios organizativos: descentralização, regionalização e hierarquização e participação popular. Princípios do SUS - Doutrinários e Organizativos + Vídeo-aulas!(cartaosusdigital.com.br). Neste artigo se diz que O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos maiores e mais complexos sistemas de saúde pública do planeta, contemplando desde o simples atendimento ambulatorial até o transplante de órgãos.

E assim, depois de fazer o encontro entre a história das lutas populares deste país e minha experiência mística de acompanhar minha mãe em sua velhice ao hospital, cumprindo o princípio bíblico do HONRARÁS PAI E MÃE, eu termino de contar minha história:

...um dia, no corredor da enfermaria da UNICAMP, já com a saúde bem debilitada, minha mãe não dormia bem. Naquele dia eu fiquei conversando com ela das 21:00 até as 23:00 com a esperança que isso lhe trouxesse o sono e eu pudesse descansar um pouco. “Lá pelas tantas”, eu lhe sugeri que dormíssemos um pouco, ela me pediu água, e eu fui buscar. Como estávamos na enfermaria havia muitas luzes, quando lhe entreguei a água minha mãe me olha com convicção e diz com a firmeza que lhe era própria:

- “NILCÉIA, VOCÊ ESQUECEU A PORTA DA GELADEIRA ABERTA!”

Eu, que não era louca para contrariá-la às “onze e tanta” da noite, lhe disse carinhosamente: “sim mãe, eu deixei a porta da geladeira aberta, a senhora pode dormir que eu vou fechar a porta da geladeira”. Fui jogar o copo no lixo, e quando voltei minha mãe estava dormindo....

Eu sentei na cadeira almofadada do lado da maca dela, coloquei meu travesseirinho e encostei a cabeça na parede e tive uma noite de sono maravilhosa, sabendo que se minha mãe tivesse uma emergência havia por ali enfermeiros que a socorreriam antes que eu acordasse.

Você pode estar pensando: você está feliz porque dormiu em uma cadeira almofadada no corredor?

Eu te respondo, fazendo em minha alma um gesto de reverência, com o devido respeito àqueles que lutaram pelo SUS em nosso país:

É que poderia ser pior, muito pior. Poderia não haver a cadeira, poderia não haver o atendimento médico gratuito pelo SUS, e minha mãe poderia estar em casa, sem atendimento, como eu pude assistir em minha infância no interior de Minas Gerais.

Sim, poderia ser pior…

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