Uma história bem sucedida
Quando terminei a faculdade de psicologia, estava desempregada e logicamente sem dinheiro. Esse foi um dos períodos difíceis que passei. Não foi o único e nem o último. Estou convencida que a vida é uma sucessão de desafios. Em alguns nos saímos muito bem, em outros nem tanto.
Esse período pós formatura foi um dos momentos em que minha performance foi perfeita. Acho que não preciso dizer aqui que quando estamos com problemas o número de pessoas prontas a criticar é muito grande.
No último ano da faculdade, eu estava trabalhando mas não consegui conciliar as obrigações de estágio e trabalho. Estava exausta, pesando 51 quilos e tinha a clara sensação de que não iria dar conta. Tomei uma decisão radical, não sei se foi sábia, mas foi radical. Pedi um acordo no trabalho, e com o dinheiro da demissão, terminei a faculdade e ainda sobrou algum dinheiro. E tudo foi razoável até que esse dinheiro acabou...
Eu ia pra Campinas de manhã procurar trabalho. Não comia nada durante o período da manhã. Se surgisse alguma entrevista para o período da tarde, eu tomava um refrigerante e comia um salgado. E achava o máximo como o refrigerante tinha o poder de tirar a fome. Hoje, com o advento da internet e com a faculdade de Educação Física do marido, descobri que esse fenômeno se dá devido ao excesso de açúcar e que é intensamente prejudicial à saúde – mas enfim, sobrevivi.
Aí, começou a grande aventura. Precisando de dinheiro de terceiros para procurar emprego, as críticas começaram a “chover de todos os lados”. Foi então que organizei o auto treinamento mais intenso da minha história de vida:
1. Parei de assistir TV para não ter distração.
2. Tracei mentalmente o objetivo claro e preciso que precisava de um emprego.
3. Rezava o terço todos os dias em posição de meditação da yoga (lótus)
4. MANTINHA O PENSAMENTO INTENSAMENTE VOLTADO PARA ESSE OBJETIVO. Qualquer outro pensamento, conflito social, falta de dinheiro, privação, críticas sociais, humilhações, eram simplesmente retirados da minha mente e voltava a atenção para o problema central – a necessidade de emprego.
5. Meditava na frase do Evangelho – TUDO QUE PEDIRDES AO PAI EM MEU NOME ELE ATENDERÁ.
Não me lembro o que eu fiz com os meus sentimentos nesta época. Acho que eles foram colocados no quesito esperança, e unificado à prática de direcionamento do pensamento. Não me lembro quanto tempo exatamente durou a prática. Lembro apenas que um dia cheguei em casa e minha mãe me disse – “vai na casa da sua irmã que ela ouviu uma proposta de trabalho para você, e é urgente.”
Ao chegar na casa da minha irmã, ela me contou que havia ouvido no rádio, por uma acaso, enquanto lavava roupa e estava procurando sintonizar uma rádio, que eles estavam chamando com urgência candidatos para o Conselho Tutelar de Sumaré, e que o prazo da inscrição terminava no próximo dia. Minha irmã havia anotado o endereço da inscrição, o horário da mesma. Deduzimos os documentos que tinha de apresentar e no outro dia, lá vou eu fazer a inscrição.
Me lembro que saí de lá, com a data da prova, a explicação que a prova seria dissertativa, e apenas sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e me deram o ECA para estudar.
Eu sou formada em psicologia, todo meu raciocínio é avesso a raciocínio metódico. Enfim, fui para casa decidida a estudar. Comecei a estudar a lei. Primeiro item por item, percebi que não estava aprendendo nada. Sentia um sono e um cansaço fora do comum. Decidi mudar a técnica de estudo. Me lembrei da orientação da minha Professora de Psicologia Social sobre estudar – “quando estiver com dificuldade em aprender algo, organize o estudo pelo tempo”. Por exemplo, decida estudar por meia hora e estude da melhor forma possível.
Assim, decidi que nos próximos dias eu leria o Estatuto da Criança e do Adolescente inteiro. Não tinha como eu garantir a minha própria aprendizagem. Simplesmente o leria, independentemente de estar conseguindo absorver o conteúdo ou não. O leria quantas vezes o tempo me permitisse, leria em todas as horas vagas. Tentaria refletir sobre o assunto. E assim, após a terceira leitura da lei como um todo, comecei a perceber alguns pontos principais, alguns conceitos gerais, mas não tive tempo de me aprofundar naquilo que eu estava começando a entender.
E lá fui eu para a prova. Tenho clareza que o estudo do Estatuto foi crucial para a minha aprovação. Mas também toda a história de leituras diversas, participação em Movimentos Sociais, o interesse em assistir palestras e reportagens sobre o tema.
Achei a prova fácil. De fato fui aprovada. Mas tinha a segunda fase – ENTREVISTA PSICOLÓGICA. Não tinha a menor ideia do que iria encontrar. Encontrei uma psicóloga fria, mecânica, com perguntas preparadas. Não me lembro de nenhuma pergunta da entrevista, apenas que em um determinado momento fiz o que se chama hoje de “apertar o botão do foda-se”, ou como prefere os(as) católicos(as) mineiros(as), COLOQUEI AOS PÉS DA CRUZ DE CRISTO. Os irmãos e meus irmãos e irmãs evangélicas dizem ENTREGUEI PARA DEUS. Respondi friamente, com uma racionalidade cortante e totalmente despreocupada em agradar ou ser compreendida.
Sai de lá com a certeza de que não seria escolhida. Durante todo o tempo do processo seletivo, MANTIVE MINHAS PRÁTICAS ESPIRITUAIS. Então simplesmente voltei para a minha procura intensa de trabalho, utilizando o refrigerante para disfarçar a fome. Pensava que, se surgiu essa oportunidade, surgiriam outras.
Depois de algumas semanas, ao chegar em casa, brinco com a minha mãe: onde está a carta me chamando para começar a trabalhar? Ela me pergunta: como você sabe? A moça da Prefeitura passou aqui hoje para te convocar para vaga do Conselho Tutelar, disse que sua posse vai ser 26/08, mas você precisa apresentar essa lista de documentos amanhã.
Nem respondi a pergunta da minha mãe. A verdade é que eu não sabia. EU APENAS HAVIA BRINCADO COM SORTE, OU MELHOR, COM A MINHA PRÓPRIA ESPERANÇA.
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