Esse texto foi escrito às pressas. Já disseram que a mente humana não "dá conta" de processar o excesso de informações da era digital. Estava eu aqui, "tranquilamente" investindo meu tempo em elaborar e estruturar o texto dessa semana, embasado em uma inspiração que tive a partir da conversa com um amigo, sobre a importância de se ficar em casa na pandemia em contradição a necessidade de viajar para reencontrar o equilíbrio necessário e manter a sanidade mental. Texto quase pronto, já no final da correção, e de repente me dei conta:
MAS É SETE DE SETEMBRO, MANIFESTAÇÕES, GRITO DOS EXCLUÍDOS!
E a mente dispara em refletir no assunto. 🏃🏼♀️🧠🏃🏼♀️
Calma aí, não me acusem!
Não sou tão alienada assim.
Eu tenho acompanhado nas mídias as polêmicas das manifestações. Apenas, até agora, domingo de manhã, o tema não tinha me causado inspiração para escrever sobre ele.
Então disparei a pensar e percebi que talvez essa seja uma boa oportunidade de me posicionar claramente para os meus leitores e leitoras e seguir o fluxo da energia que acredito que o pensamento coletivo cria. Busquei em minha memória eventos sobre o tema, e fiz o que estou aprendendo a fazer bem. Contei histórias.
Mas é um texto pensado objetivamente, construído a partir do esforço racional de contemplar um tema. Não é um texto produzido a partir dos processos de inspiração que normalmente me ocorrem.
Comecei pelo começo.
Por que o tema não mobilizou minhas inspirações?
E conclui que é porque a Independência do Brasil nunca foi significativa pra mim. De novo, não me levem a mal, é que pra classe trabalhadora desse país nunca houve independência. E desde criança, entre oito e dez anos, mesmo sem grandes conhecimentos, quando como aluna da escola pública era levada aos desfiles, eu achava tudo aquilo um "saco". Me cansava de ver aquele “monte” de pessoas na rua, me apertando, me amassando. Eu era uma garota de sítio, acostumada a ter espaços largos para ficar. Odiava aquela "muntueira". Talvez inconscientemente eu sabia que tudo aquilo era uma grande encenação.
Na adolescência, quando era aluna do Curso de Formação Profissional dos Patrulheiros de Campinas, fui convidada para o desfile de Sete de Setembro, mas escolhi não ir. Garota precoce na participação política não queria fazer parte daquela farsa.
Quando fazia faculdade, peguei algumas aulas no Estado e quando chegou o Sete de Setembro tive que ajudar a organizar a participação da escola no desfile. Nos dividimos em equipe com o objetivo de trabalhar temas específicos. O professor de história me convidou para trabalhar com ele e decidimos desenvolver com os adolescentes os temas que ainda se tornam necessários adquirir independência neste país.
Me lembro até hoje que o tom de voz do locutor que estava anunciando o desfile mudou ao começar a ler os cartazes. Mas ele leu todas as denúncias. Me lembro em especial a denúncia que fizemos da poluição do rio da cidade, que a anos jazia sufocado pelos esgotos. E que todos os anos, em época das enchentes, transbordava, inundando as casas das pessoas que moravam à sua beira.
Em tempos de confusão ideológica entendo que tudo precisa ser explicado. Antes que meus amigos ultra conservadores pensem que eu fazia política na escola e doutrinava os alunos, não considero que o trabalho tenha sido isso. Apenas destacamos para a comunidade um problema ambiental que era real e precisava ser explicitado na esperança de ser superado.
Citando minha amiga, quando descreve efusivamente a sua atuação em um confronto que teve a favor da classe trabalhadora, e alguém lhe pergunta:
- O que ficou resolvido?
- NADA.
- Mas então, porque você está tão animada?
- É QUE EU GOSTEI MUITO DA MINHA ATUAÇÃO.
Destaco que naquele Sete de Setembro do século passado EU GOSTEI MUITO DA MINHA ATUAÇÃO.
Agora na vida adulta, faço parte da Pastoral Operária de Campinas, que é uma das entidades que ajudam a organizar o Grito dos Excluídos e Excluídas de Campinas. Minha contribuição ao projeto em si é mínima. São outras pessoas da equipe que trabalham diretamente nele. E aqui preciso dizer que EU GOSTO MUITO DA ATUAÇÃO DELES.
Destaco alguns pontos que me foram significativos ao longo dos anos em que participo do grito dos excluídos.
A primeira, é a lembrança de quando o Grito estava sendo realizado na Vila Industrial. Eu morava por ali, cheguei da casa da minha mãe e me dirigi ao local onde estava ocorrendo o desfile. Já estava no final e eu vi as pessoas organizando as coisas pra irem embora. Tinha algumas pessoas vestidas com uma roupa colorida, provavelmente tinham feito alguma coreografia. Tinha uma faixa contra a homofobia. E eu fiquei ali, parada, contemplando aquela cena. Enquanto tudo se desfazia através do movimento ágil das pessoas, eu tive uma VISÃO DE ESPERANÇA que a muito não sentia. Me parecia que aquelas pessoas caminhando levavam embora todos os problemas do país e traziam para o seu lugar uma GRANDE ESPERANÇA - UMA ESPERANÇA QUE SE CONCRETIZA NO CAMINHO, NA TEIMOSIA DO CAMINHO. Foi um momento de CONVERSÃO.
Desde então passei a participar do Grito dos Excluídos. A lembrança que mais me marca destes eventos é a presença forte da polícia fechando a rua, impedindo as pessoas de descerem. Fica pra mim a lembrança esperançosa de homens e mulheres corajosos, despojados de qualquer proteção, que vão lá conversar com homens armados para conseguirem desvencilhar as barreiras e abrir os caminhos.
Me emociona saber que mesmo eles atrasando a entrada do Grito dos Excluídos na avenida, muitas pessoas esperam nas calçadas para nos verem descer.
Em alguns anos eu ajudei na entrega de panfletos para o público, fazendo o árduo trabalho de conscientização política no corpo a corpo. É sempre uma equipe de pessoas que faz isso.
Em 2019, último Grito dos Excluídos antes da Pandemia, fui especialmente presenteada. Encontrei vários amigos e amigas do Sindicato dos Bancários. E descemos juntas a Avenida Francisco Glicério, conversando sobre a vida e as lutas sociais, nossas angústias, novos caminhos, necessidade de decisões, medos............
FIM
FIM?
Observação: esse é um trabalho sem um fim definido, sem uma conclusão objetiva dentro dos padrões de organização de texto – é que na vida real a CAMINHADA CONTINUA SEMPRE e as conclusões são sempre inusitadas. Um eterno vir a ser. Às vezes apenas nos apresentam outras lutas.....
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